A QUEM DEUS ESTÁ PRESO?
- Pr José Francisco
- 27 de ago.
- 4 min de leitura
Uma reflexão sobre a liberdade de Deus, baseada em Esdras 1

Acho que como todo “crente evangélico” fui acostumado a pensar que Deus usa apenas aqueles que são crentes evangélicos e mais ninguém. Nós temos o monopólio de Deus! Nós não pertencemos a ele, mas ele nos pertence; e não concordaríamos com ele se fosse de outro modo, mas o bom da narrativa bíblica é que este outro modo está presente nos relatos.
Deus é o Soberano Senhor. Suas palavras foram dadas aos seus santos profetas e apóstolos no Novo Testamento, porém, Deus nunca esteve preso ao homem (seja evangélico, católico ou ateu) e nem pode estar. Ele usa meios humanos ou miraculosos para cumprir o seu bem querer (chamado beneplácito nas Escrituras). É certo que, na maioria das vezes, nas Escrituras, vemos o Senhor usando homens que estão, ou que fazem parte da aliança para realizar sua obra, outras vezes não os usa. Provavelmente a jumenta de Balaão não fazia parte da aliança! A filha de faraó, que cuidou de Moisés também não, mas tanto o animal quanto a princesa do Egito foram instrumentos de Deus.
No livro de Esdras, logo no início, não vemos um grande profeta sendo comissionado, nem mesmo um israelita – que fazia parte do povo da aliança – ser levantado para erguer o moral do povo. Deus não usou nenhum israelita para fazer o povo se lembrar que deveria retornar a Terra Prometida. O Espírito Santo usa Ciro, o rei da Pérsia. Ciro havia conquistado a Babilônia em outubro de 539 a.C, e agora dominava tudo que outrora pertenceu a Nabucodonosor e muito mais.
O início do livro já é uma sensacional exceção dentre os demais livros inspirados. O livro de Esdras não começa com a frase do pacto: “Ouve Israel! ”, mas com o despertar de um rei pagão (v.1), já demonstrando a liberdade de Deus de usar quem quer para sua obra. Está escrito que, “para que se cumprisse o que fora dito por Deus ao profeta Jeremias, Deus despertou o coração de Ciro, rei da Pérsia”. Para que se cumprisse a profecia da narrativa da redenção, Deus levanta um pagão! Que liberdade nosso Deus tem! Como é inescrutável sua vontade soberana!
Ciro é despertado já no seu primeiro ano e Deus fala ao seu coração. Ciro, para nosso assombro, fala como quem tem consciência de que é Deus Iavé, o verdadeiro dono de tudo, que fala com ele. Ciro se expressa como um verdadeiro profeta de Deus, mesmo não fazendo parte da aliança abraâmica. Note as palavras do rei: “... o Senhor, o Deus dos céus me deu todos os reinos da terra e me encarregou de lhe edificar uma casa em Jerusalém de Judá” (Ed 1.2). Compreende-se: a) um tom profético; b) consciência de que era “o Senhor, o Deus dos céus”; c) reconhecimento de que foi o Senhor que lhe abençoou e d) consciência de que tinha um serviço a fazer.
Ciro certamente não obteve todo o conhecimento da religião judaica, mas com sua frase, no verso 3: “... ele é o Deus que habita em Jerusalém”, parece que pensava como os judeus; que Iavé habitava apenas num lugar geográfico, em Sião. O rei também foi despertado na área financeira (um verdadeiro milagre até para quem é da aliança!), pois ele mesmo bancou toda a reforma. Ciro muniu o povo com prata, ouro e tudo que se fazia necessário para a reconstrução da cidade e do Templo. Este rei age de forma diametralmente oposta a Nabucodonosor (Dn 4.28-31), antigo rei da Babilônia, que se achava um deus na Terra. O texto diz que Ciro reconhece que não foi por sua força ouestratégia militar o motivo pelo qual conquistou tantas terras, mas que o Senhor lhe havia dado os reinos da terra.
No versículo 5 vemos que o povo de Deus desperta. Um povo já acomodado e que já não se importava mais se ficassem para sempre onde estavam. Entendemos que os planos de Deus não são frustrados nunca e que, pelo despertar do Espírito Santo, Israel teria de retornar. Entendemos, pois, que Deus usa quem quer para cumprir seus desígnios, pois é fiel e cumpre o que diz. Se quisermos entender Esdras 1 como uma crítica ao marasmo do povo da aliança, que já não estava “nem aí” se voltariam ou não para Jerusalém, podemos ver desse modo, mas sempre lembrando de que Deus havia, por boca de Jeremias, profetizado tal regresso.
Os textos que criticam ações dos relapsos servos de Deus não são incomuns (2 Sm 11.1). O certo é que Deus sempre vai usar quem ele quiser para realizar sua obra, mas isso jamais poderá ser uma desculpa para que nos acomodemos. Todos que já fazemos parte da aliança (eterna aliança no sangue de Jesus Cristo) devemos evitar o marasmo e partirmos à luta. Deus vai usar ímpios, mas não precisamos sempre esperar por isso!
Pr. Rego Antunes de Moraes Duarte.
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